O MARCO DE GARANTIAS E A EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL - POR FÁBIO BRAGA


Paula Brito - 15/01/2024

O Marco Legal das Garantias está em vigor desde o último 31 de dezembro, atualizando normas relativas a várias modalidades de garantias, inclusive a alienação fiduciária no âmbito do mercado financeiro e de capitais. O texto final fora editado sob veto presidencial justamente naquilo que se revelava inovador e de grande utilidade em operações no mercado de crédito, ou seja, a busca e apreensão extrajudicial de bens móveis alienados fiduciariamente. Teórica inconstitucionalidade do novo procedimento de busca e apreensão fora considerada para justificar veto a vários dispositivos consistentes em parágrafos do artigo 8º - C do Decreto-lei nº 911/69.

Segundo o Executivo Federal, a busca e apreensão extrajudicial violaria cláusula de reserva de jurisdição, além de apresentar potencial para expor a risco certos direitos e garantias individuais, como o devido processo legal e a inviolabilidade do domicílio. Porém, após novas discussões parlamentares, o Congresso Nacional rejeitou os vetos e restaurou a versão original dos dispositivos.

Como se sabe, a alienação fiduciária em garantia produz efeitos de transferência para o credor da propriedade resolúvel e da posse indireta da coisa móvel alienada em garantia fiduciária, sem que o devedor (fiduciante) fique impedido de manter-se na posse direta do bem.

Em caso de inadimplemento ou de mora no cumprimento das obrigações garantidas, prevê a lei que o credor poderá vender o bem, desde que não haja disposições contratadas em contrário. A mora ou o inadimplemento de parcela garantida são bastantes para facultar ao credor considerar vencidas antecipadamente todas as obrigações vincendas sob o mesmo contrato. Nesses casos, o Decreto-lei nº 911/69 facultava ao credor (i) requerer, em juízo, busca e apreensão ou (ii) converter a busca e apreensão em ação de execução com penhora de bens do devedor. Porém, com a rejeição dos vetos, passará o credor a ter a opção de consolidar a propriedade do bem perante o cartório de registro de títulos e documentos do domicílio do devedor ou da localização do bem, iniciando a execução extrajudicial da alienação fiduciária.

Nesse caso, requererá ao oficial de registro a notificação do devedor fiduciante para (i) pagar voluntariamente a dívida em 20 dias, sob pena de consolidação da propriedade ou (ii) comprovar documentalmente que a cobrança é DA #10726358 v1 parcial ou integralmente indevida. Havendo contestação do devedor, o oficial avaliará documentos que lhe forem apresentados e, constatando o alegado direito do devedor, deverá e Se a alegação for de invalidade parcial da cobrança, o valor que o devedor entender correto deverá ser indicado e pago no mesmo prazo de 20 dias, podendo o credor levar ao Judiciário eventual discussão a respeito do valor parcialmente pago e do saldo a pagar.

Se não pagar a dívida nem parcial nem integralmente, o devedor estará obrigado a entregar ou a disponibilizar o bem, sob pena de multa de 5% do valor cobrado. Caso a entrega não se dê, o credor poderá requerer a busca e apreensão extrajudicial do bem garantidor.

O novo procedimento contempla a busca e apreensão extrajudicial mediante: (i) inserção de restrição de circulação e de transferência do bem na base de dados do registro nacional de veículos, em se tratando de veículo automotor (o respectivo cancelamento deverá ser efetivado uma vez realizada a apreensão); (ii) comunicação do fato aos órgãos de registro para averbação da indisponibilidade do bem e da própria busca e apreensão extrajudicial; (iii) registro da busca e apreensão extrajudicial na plataforma eletrônica mantida pelos cartórios de registro de títulos e documentos e, por fim, (iv) expedição de certidão de busca e apreensão extrajudicial do bem.

Outra novidade no regime jurídico da garantia fiduciária de bem móvel é que o credor poderá realizar diligências para localizar o bem (conceito de “self-help”) ou contratar terceiros para isso (que poderão ser empresas especializadas em localizar bens; os seus requisitos mínimos de funcionamento deverão ser definidos pelo Poder Executivo).

Concretizada a apreensão, a venda poderá ser realizada. O novo texto legal não estabelece fórmula para guiar, de modo específico, o processo de venda, que poderá ser definido pelo próprio credor, sendo cabível inclusive a inserção de cláusulas a esse respeito nos instrumentos contratuais.

O mercado espera que a extrajudicialidade trazida pela nova forma de busca e apreensão de bem móvel em garantia fiduciária sirva para destravar o acesso ao crédito, possibilitando, eventualmente, redução de custos de certas operações.

*Fábio Braga é sócio da área bancária e financeira de Demarest Advogados

Fonte: Valor Econômico


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