CARTÓRIOS DE PROTESTO RECUPERAM MAIS DE R$ 50 MILHÕES A EMPRESAS DE SERVIÇOS ESSENCIAIS NO BRASIL
Paula Brito - 14/06/2022
A crise econômica agravada pela pandemia dificultou o pagamento de contas de serviços essenciais, como água, luz e gás. Em junho do ano passado, o mercado financeiro contabilizou quase 37 milhões de dívidas desse tipo em atraso, o que representa 22,3% do total de débitos dos brasileiros. Em maio de 2020, esse número era de 21,60%.
Grandes empresas brasileiras de água, luz, gás e saneamento já protestavam clientes inadimplentes antes mesmo da pandemia, em acordo com a Lei nº 9492/1997, que regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos.
Segundo a legislação, esses títulos são protestáveis, seja quando apresentam duplicatas mercantis ou de serviços, bem como contratos de prestação de serviços, sem qualquer questionamento judicial, estando previstos não só na respectiva Lei do Protesto, mas também na lei das duplicatas e nas normas estaduais editadas pelos Tribunais de Justiça correspondentes.
Um levantamento realizado pelo Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil (IEPTB-BR) demonstra que nos últimos três anos pelo menos 11 empresas brasileiras de serviços básicos recuperaram cerca de R$ 50 milhões por meio dos Cartórios de Protesto junto a clientes inadimplentes, sendo que mais de 90% desse valor foram recuperados durante a pandemia.
Enquanto a Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) recuperou cerca de R$ 40 milhões em apenas dois anos, a Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia (Neonergia Coelba) conseguiu recuperar mais de R$ 4,5 milhões desde o ano de 2019.
Já a Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa), que está situada em 366 dos 417 municípios baianos, recuperou mais de R$ 4,7 milhões nos últimos três anos com o instrumento do protesto de títulos. Em 2021, havia registrado uma evasão de 12,86% nas contas pagas pelos seus clientes.
De acordo com o gerente de cobrança da Embasa, Daniel Torres de Oliveira, o Protesto é mais uma ferramenta de cobrança que contribui para a redução da inadimplência junto à empresa. “A Embasa pretende continuar utilizando o Protesto como mais uma ferramenta do processo de cobrança e dentro da política de negociação da empresa, oferecendo aos seus usuários diferentes modalidades para retorno à adimplência”, destaca Oliveira.
Apesar da eficiente colaboração do Protesto em relação aos consumidores e às taxas de inadimplência - a ferramenta tem recuperado cerca de 65% dos títulos em até três dias úteis após a intimação do devedor para efetuar o pagamento da dívida - algumas empresas têm sofrido questionamentos de órgãos ligados ao direito do consumidor, por acreditarem que as cobranças oneram demais os clientes dessas companhias.
“Os questionamentos que existem normalmente decorrem de desconhecimento dos órgãos de defesa do consumidor sobre a existência da Lei de Protesto e de sua normatização pelas Corregedorias Gerais de Justiça”, relata Cloves Siqueira, titular do 6º Ofício de Protesto de Letras de Manaus (AM). “Falta discernimento aos gestores destes órgãos sobre a diferença entre o Protesto extrajudicial e a negativação direta pelos birôs e empresas de proteção ao crédito. Quando questionam a atuação dos Tabelionatos de Protesto, utilizam sempre o Código de Defesa do Consumidor no que se refere às negativações, demonstrando a confusão feita sobre o Protesto e as negativações diretas”.
De acordo com o advogado Arthur Salles de Paula Moreira, mestre e doutorando pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), as discussões sobre a possibilidade de realização de negativação e protesto de dívidas relativas a serviços básicos já chegaram ao Judiciário inúmeras vezes.
“No início desse ano mesmo, o STF pronunciou-se sobre a questão ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6.668. Naquela ocasião, foi declarada a inconstitucionalidade de uma Lei do Estado de Minas Gerais que impedia a negativação de usuários dos serviços de abastecimento de água e esgoto por atraso no pagamento da conta. Ou seja, o STF reafirmou a possibilidade de negativação mesmo em relação a dívidas relativas a um serviço essencial. Nesse cenário, portanto, não existe um impedimento para realização do protesto sendo possível a sua realização caso haja atraso no pagamento das contas relativas a serviços básicos”, argumenta o advogado.
Segundo o juiz de Direito da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo Marcelo Barbosa Sacramone, enquanto o Protesto consiste na criação de documento público que oficializa a inadimplência e o descumprimento de uma obrigação originada em títulos ou documentos de dívida junto a um Cartório, a negativação, por sua vez, é modalidade de cobrança em que o nome do devedor é inserido em cadastro de entidades de proteção ao crédito, sendo que com tal inclusão pode-se limitar que o inadimplente contrate novos financiamentos.
“O Protesto somente pode ser lavrado por tabelião, que é dotado de fé pública. Ele examina os aspectos formais do título para verificar se o instrumento cumpre todos os requisitos essenciais. Ele é essencial para o exercício regular do direito de cobrança de coobrigados de títulos de crédito, como os endossantes e avalistas, por exemplo. A negativação, por sua vez, ocorre quando as empresas inserem a pendência financeira nas entidades de proteção ao crédito, o que limita o direito do consumidor nas novas contratações. Eventual incorreção, pagamento do título, inexistência da obrigação permite a caracterização da referida limitação como indevida, o que poderá ensejar reparações de danos”, explica o magistrado.
Para o juiz do Tribunal Regional Federal da 2ª Região Marcelo Barbi Gonçalves, “realizando o Protesto junto ao Cartório extrajudicial, o fornecedor de serviços básicos terá uma ferramenta célere, econômica e eficaz para a satisfação de seu crédito”.
“Recorde-se que o cliente e o fornecedor podem se utilizar da Cenprot, disciplinada pelo Provimento 87/2019 do Conselho Nacional de Justiça, para a composição amigável do litígio em ambiente digital, o que consolida o Tabelionato de Protesto como uma instituição fundamental para, de um lado, desafogar o Poder Judiciário, e, de outro, assegurar a tutela do crédito, o que é nodal para o crescimento das atividades negociais”, analisa o magistrado.
O doutor e mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e professor da Graduação e Mestrado na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) Marcelo Abelha Rodrigues explica as diferenças entre o instrumento do Protesto e a negativação.
“A diferença básica é que um é ato público (Cartório) e o outro é privado (Serasa). A natureza jurídica dos serviços notariais e de registro é de serviços públicos (regime jurídico de Direito Público ADIN 1.378-MC- 1995), embora seu funcionamento e estrutura possam ser regulamentados de forma privada. O Serasa é um escritório privado que coleta e recebe informações de entes privados (em torno de 500 mil associados) formando um banco de dados sobre a impontualidade de pagamento nos mais diversos segmentos que servem para apoiar os serviços de créditos dos seus consulentes”, argumenta o docente.
Mesmo as entidades ligadas ao consumidor, como o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), entendem que o Protesto é instrumento eficaz e legal, amparado por lei e que busca impulsionar o mercado de crédito.
“Quando ocorre o pagamento ou renegociação da dívida, a responsabilidade de dar baixa no Protesto é do devedor, enquanto que nas negativações, essa baixa fica a cargo do credor e da empresa de proteção ao crédito, devendo ocorrer em até cinco dias úteis, a contar da confirmação do pagamento. O protesto é investido de caráter público, pois é objeto de registro em cartório, perante o tabelião, cujos atos gozam de presunção de legitimidade e de oficialidade”, relata o assessor jurídico da Área de Relacionamento do Idec, David Douglas Guedes.
Autor do artigo “Resolução 1.000 da Aneel: acréscimos moratórios e a não regulada possibilidade de protesto”, o advogado Fábio Amorim é presidente da Comissão de Direito de Energia Elétrica da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Rio de Janeiro (OAB/RJ). Em seu texto, o advogado explora a possibilidade da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a partir da sua Resolução Normativa n° 1.000/2021, prever, no combate à inadimplência, a possibilidade do Protesto.
Segundo a Aneel, a norma agrega os atos normativos relativos aos direitos e deveres do consumidor e dos demais usuários do serviço público de distribuição de energia elétrica. “Ela é, portanto, um dos regulamentos mais importantes da Aneel, pois define, de maneira mais simples e objetiva, as responsabilidades dos agentes e os procedimentos a serem seguidos pelos consumidores para que o acesso universal ao serviço de energia elétrica esteja disponível com qualidade e eficiência”, destaca a autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia.
Para o presidente da Comissão de Direito de Energia Elétrica da OAB/RJ, Fábio Amorim, para combater a inadimplência existe por parte da concessionária, com fulcro na legislação em vigor, a possibilidade de negociação, suspensão de serviço, cobrança, protesto e outras formas que visem a estancar o acúmulo de faturas inadimplidas.
“As principais companhias de energia, como Enel, Eletropaulo, Elektro, EDP e CPFL estão utilizando os serviços dos Cartórios de Protesto para cobrar suas contas em atraso. Presente e cabível na legislação, doutrina e jurisprudência pátria, não há dúvida de que a distribuidora pode e deve, com a devida cautela, prever, no combate à inadimplência, a possibilidade do Protesto”, ressalta o advogado.
De acordo com o advogado e presidente da Comissão Notarial e de Registros Públicos do Conselho Federal da OAB-CF, Tiago de Lima Almeida, diversas empresas de serviços básicos estão utilizando os serviços dos Cartórios de Protesto para cobrar suas contas em atraso.
“O Cartório encaminha uma intimação com o boleto e aviso de recebimento ao cliente impontual, caso o pagamento não ocorra no prazo fixado na intimação, o título é protestado. Os números mostram que a recuperação desses créditos foi potencializada por meio do protesto, o que beneficia indiretamente os credores que arcam com as suas contas pontualmente, já que a inadimplência recuperada não impactará em prejuízo aos prestadores de serviços e, logo, não ocasionará o aumento do preço do serviço para recuperar tal perda”, salienta o advogado.
Para o advogado e professor de Direito Comercial Armando Luiz Rovai, que já foi secretário Nacional do Consumidor, não faz sentido o instrumento do Protesto utilizado por estas empresas sofrer questionamentos por parte de associações e entidades ligadas ao direito do consumidor.
“Existem algumas posições contrárias à utilização do protesto para cobrança de dívidas, uma vez que o título protestado fica registrado no CPF da pessoa e pode dificultar uma obtenção de crédito. Porém, cabe destacar que o protesto gera uma segurança nas relações negociais, visto que os contratantes têm uma maior previsibilidade de recebimento de seus contratos. Ainda, consigna-se que a utilização deste meio para todas as cobranças em atraso privilegia e favorece o bom pagador, tendo em vista que este não terá nenhum tipo de restrição ou anotação em seu cadastro”, reforça o advogado.
O CASO ENERGISA
O Grupo Energisa se notabiliza por ser o quinto maior grupo de distribuição de energia do Brasil, atendendo a uma população de mais de 20 milhões de pessoas em 862 municípios brasileiros. São mais de 19 mil colaboradores com 11 distribuidoras espalhadas por 11 estados brasileiros: Paraíba, Sergipe, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Paraná, São Paulo, Rondônia e Acre.
Com um número elevado de clientes, a Energisa optou, em 2017, por utilizar os Cartórios de Protesto para garantir a adimplência e a recuperação de dívidas da empresa.
“O Protesto é um instrumento importante para a adimplência e recuperação de dívidas e está inserido em um amplo contexto de várias ações de cobrança que são definidas de acordo com a persona, ou seja, o perfil de pagamento de cada cliente. O objetivo é sempre utilizar ações de cobranças assertivas, que sensibilizem os clientes a regularizar o débito ou a nos procurar para a negociação dos mesmos”, explica o diretor presidente da Energisa, Marcelo Vinhaes.
Para Vinhaes, a inadimplência representa uma perda financeira que compõe a tarifa de todos os consumidores da concessão, inclusive os que estão adimplentes. Segundo ele, o instrumento de Protesto tem contribuído na redução no nível de inadimplência e consequentemente no impacto dos valores tarifários para todos os consumidores.
Embora o nível de inadimplência das famílias brasileiras tenha chegado à cerca de 25% do total durante a pandemia, a Energisa tem buscado cobrar os devedores de uma maneira célere, prática e eficiente, utilizando o instrumento do Protesto de Títulos. Segundo dados do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil (IEPTB-BR), a ferramenta tem recuperado cerca de 65% dos títulos que vão a Protesto em até três dias úteis, após a intimação do devedor para efetuar o pagamento da dívida.
Apesar de ser previsto em lei e de ter notável alcance e possibilidade de recuperação, o instrumento do Protesto de Títulos foi questionado pela Superintendência para Orientação e Defesa do Consumidor (Procon-MS), que chegou a solicitar da Energisa explicações sobre o protesto de clientes com débitos com a empresa.
O documento questionava as empresas concessionárias sobre os regramentos utilizados para enviar o débito ao Cartório para protesto. Procurado pela reportagem, o Procon-MS preferiu não se manifestar.
Segundo a coordenadora do programa de serviços financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim, fazer uma avaliação de um plano de recuperação do país ainda é precoce, mas o instrumento do protesto é uma ferramenta que pode ser utilizada nesse sentido. “Todos os instrumentos que contribuírem para reduzir o custo do crédito, viabilizar acordos, reduzir a inadimplência e aumentar a capacidade de pagamento dos consumidores contribuirão para o resgate da economia”, destaca Amorim.
Os próprios Cartórios de Protesto oferecem a solução de quitação e renegociação de dívidas para cumprir as exigências do Provimento nº 72, que dispõe sobre medidas de incentivo à quitação ou à renegociação de dívidas protestadas diretamente nos Cartórios de todo o Brasil.
Para o gerente comercial da Energisa, Helier Fioravante, o instrumento do Protesto garante segurança jurídica ao credor e ao devedor, sendo mais célere e de menor custo para ambas as partes. “O Protesto é um instrumento célere e de segurança jurídica necessária à satisfação das obrigações dos títulos e documentos de dívida. Neste sentido, o Protesto se mostra como uma solução extrajudicial que garante o fomento do mercado, tornando as relações de crédito muito mais transparentes por conta de sua publicidade”, diz o gerente da Energisa.
Segundo o presidente do Instituto de Estudo de Protesto de Títulos do Brasil - Seção Mato Grosso do Sul (IEPTB/MS), Leandro Augusto Neves Corrêa, há inúmeras vantagens do Protesto em relação a outras formas de cobrança de dívidas.
“O Protesto é um ato formal para cobrança das dívidas em atraso, onde o credor pode dirigir-se até o cartório, apresentando a documentação que comprova a dívida. Após protocolado o pedido, o devedor receberá a visita de um intimador no endereço indicado pelo credor, e terá o prazo legal de três dias úteis para o pagamento. Caso este seja realizado dentro do prazo, o crédito será repassado na conta indicada pelo credor em 24 horas”, detalha o presidente do IEPTB/MS.
SOLUÇÃO DIGITAL
Desde 2019, os Cartórios de Protesto em todo o país contam com a Central Nacional de Serviços Eletrônicos dos Tabeliães de Protesto de Títulos (Cenprot), que fomentou uma verdadeira revolução digital nos Tabelionatos e no sistema financeiro brasileiro.
Além de uma Central de escrituração e emissão de duplicatas, a Cenprot Nacional disponibiliza outros cinco serviços eletrônicos: recepção e distribuição de títulos (CRA), consulta pública e gratuita de um título protestado, acesso ao instrumento de Protesto eletrônico, declaração de anuência eletrônica e pedido de cancelamento de Protesto, além de pedido de certidão digital e confirmação de autenticidade.
Segundo a assessora jurídica da FecomercioSP, Ana Paula Locoselli, a Central possibilita que todos os títulos levados a Protesto sejam disponibilizados e distribuídos em todo o Brasil. “O Provimento 87 é de grande importância, uma vez que possibilitou a migração dos serviços cartorários para o ambiente virtual, possibilitando o barateamento dos custos envolvidos e facilitando a vida dos usuários, que podem enviar títulos a Protesto, solicitar certidões, fazer o cancelamento de protestos eletronicamente, bem como visualizar e verificar a autenticidade do instrumento”, avalia a Locoselli.
Para a professora de finanças do Insper, Juliana Inhasz, a Cenprot facilita a recuperação de dívidas na medida em que a tecnologia é colocada à disposição da sociedade, reduzindo custos, minimizando distâncias, e democratizando as soluções. “Evita-se, portanto, gastos desnecessários, minimizando perdas e gerando um ambiente mais saudável e também mais transparente para a economia. Nesse mesmo sentido, a existência do compartilhamento de informações vira ferramenta essencial, já que disponibiliza, de forma ágil e eficiente, a informação para todos os agentes interessados”, relata a professora.
A Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa) explica que a Cenprot tem facilitado o dia a dia da empresa na hora de cobrar os créditos inadimplentes dos clientes envolvidos no processo de cobrança da companhia. “Nos dias atuais, a utilização de uma plataforma digital é importante para fluidez da atividade e otimização do tempo, trazendo praticidade e rapidez”, diz o gerente de cobrança da Embasa, Daniel Torres de Oliveira.
Segundo o mestre e doutor em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo (USP) e tabelião de Protesto de Letras e Títulos de Campinas (SP), Reinaldo Velloso dos Santos, a possibilidade de Protesto dos títulos e documentos de dívida enviados por essas empresas é inquestionável.
“As fornecedoras de energia, gás e água são empresas que, como quaisquer outras, podem se utilizar dos meios judiciais e extrajudiciais legalmente previstos para o recebimento do crédito”, destaca. “O Protesto é uma medida bem diferente da inscrição de um devedor em cadastros de inadimplentes. O Protesto é lavrado por um agente imparcial, precedido de intimação com aviso de recebimento, sujeito a emolumentos previstos em lei que são de responsabilidade do devedor. A negativação é ato unilateral da empresa e não há controle quanto à ciência do devedor quanto à inscrição; em contrapartida, a empresa concessionária se responsabiliza pela baixa da restrição após a quitação. Tratam-se de medidas amparadas pela lei, mas bem distintas”, completa.
ÓRGÃOS PÚBLICOS
Os órgãos públicos podem realizar, desde 1997, o protesto das Certidões da Dívida Ativa para municípios, Estados e União, estando resguardados e amparados pela Lei 9.492, de 10 de setembro de 1997.
Segundo os relatórios da Procuradoria- -Geral da Fazenda Nacional “PGFN em Números”, desde que a Procuradoria utiliza o protesto da CDA, em março de 2013, foram recuperados para os cofres públicos da União quase R$ 9 bilhões em dívidas em todo o território nacional.
A dívida ativa é o valor originário de um débito a favor do Governo, em todas as esferas: União, Estados e Municípios. Ocorre, por exemplo, na falta de pagamento do IPTU devido a um município, gerando uma certidão de débito ao contribuinte, que atestará a sua inadimplência. Regulamentado pela legislação vigente, o Protesto possibilita a oportunidade de pagamento de débito ao devedor e permite ao credor um documento que comprove a inadimplência.
Nos anos 80, o Protesto de Dívida Ativa era utilizado pelo Governo de forma esporádica em relação aos devedores sujeitos à falência. Com a alteração da Lei do Protesto - nº 9.492/1997 -, a Certidão da Dívida Ativa (dívidas públicas) passou a ser passível de Protesto Extrajudicial.
Em 2010, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recomendou a todos os Tribunais de Justiça do País a edição de ato normativo de utilização do protesto extrajudicial com o objetivo de agilizar o pagamento de títulos e de outras dívidas devidas ao Governo, visando inibir a inadimplência e contribuir para a redução do volume de execuções fiscais ajuizadas. Com a edição da lei 12.767/2012, que incorporou a lei 9492/1997, ocorreu um substancial incremento no volume de protesto destes títulos.
Em São Paulo, por exemplo, a Procuradoria-Geral do Estado envia os créditos inscritos em dívida ativa para protesto eletrônico desde dezembro de 2012, por meio de convênio firmado com o IEPTB-SP. Segundo a Procuradoria do Estado, já foram recuperados mais de R$ 9 bilhões com CDAs por meio do Protesto de Títulos.
São débitos inscritos de ICMS, IPVA, ITCMD, ITBI, multas aplicadas pela fiscalização das Secretarias de Estado e autarquias estaduais, multa contratual, reposição de vencimentos, devolução de qualquer natureza, taxa judiciária (custas processuais) e todo tipo de débito que venha a ser inscrito em dívida ativa paulista.
Ainda de acordo com a Procuradoria do Estado, a adoção do protesto elevou a arrecadação dos débitos inscritos e não ajuizados, contribuindo para a diminuição da litigiosidade. Atualmente, o protesto, somado à educação fiscal decorrente de sua adoção, corresponde a 45,39% da arrecadação total em dívida ativa.
Segundo a procuradora do Estado Chefe da Procuradoria da Dívida Ativa, Elaine Vieira da Motta, além de aumentar a arrecadação do Estado, os Cartórios de Protesto contribuem também para diminuir os litígios judiciais.
“O sistema de protesto da PGE, desenvolvido em conjunto com o IEPTB, possibilita o envio a protesto de mais de 400 mil débitos por mês, bem como um fluxo de baixas automáticas de protesto. O protesto da dívida ativa proporciona maior eficiência na arrecadação, com um custo menor para o Estado, diminuindo também a litigiosidade na esfera judicial”, avalia a procuradora.
POSTECIPAÇÃO
Além de oferecer soluções digitais para os seus usuários, os Cartórios de Protesto também proporcionam, desde o ano de 2019, a gratuidade para os credores, como as grandes empresas de serviços básicos, na hora de protestar clientes inadimplentes. A ideia é diminuir os custos repassados para o preço dos produtos e às taxas de financiamento, afetando diretamente o custo do crédito no Brasil e beneficiando os consumidores brasileiros.
“Recolher antecipadamente gerava um aumento dos custos para o credor, que acabava embutindo esses custos no valor dos seus produtos ou serviços. Tome-se o exemplo dos bancos, que tinham que despender os valores antecipadamente e incluíam isso nos riscos dos créditos, aumentando o próprio spread bancário, o próprio custo do crédito. Isso não se coaduna com as finalidades propostas para a legislação, no sentido do incentivo e promoção do desenvolvimento econômico. A medida estabelecida pelo Provimento nº 86 é extremamente eficiente sob o ponto de vista prático”, argumenta o professor de Direito Comercial no Centro Universitário de Brasília (UniCEUB), Marlon Tomazette.
Segundo o professor da FGV Direito-Rio Gustavo Kloh, o pagamento postergado dos emolumentos tornou o Protesto acessível a todos, desde as grandes empresas até os pequenos empresários, pessoas físicas e jurídicas. “Qualquer título líquido e exequível pode ser protestado: contrato de locação, confissão de dívida. Se todos soubessem que podem se valer do pagamento postergado e acessar esse meio de cobrança, a visão negativa do Protesto poderia ser eficazmente superada”, avalia o docente.
Ainda de acordo com Kloh, o instrumento do Protesto tem notável papel no que se refere a questões como a desjudicialização e a recuperação de crédito. “Penso que a disseminação da ideia de que o protesto é um meio acessível a todo e qualquer credor, desde que tenha um título com as características necessárias, desloca a questão do centro ‘consumidor x fornecedor’ para o eixo ‘desjudicialização’. A desjudicialização é hoje um mote do próprio Poder Judiciário. A atividade notarial e registral tem um papel central a cumprir, e o Protesto, em uma sociedade pautada pelas relações de crédito, é essencial na busca desse novo modelo de resolução de conflitos”, destaca o professor.
A presidente do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil - Seção Distrito Federal (IEPTB-DF), Ionara Pacheco de Lacerda Gaioso, diz que a regra de pagamentos dos emolumentos dos tabeliães de protesto mudou em dezembro de 2019 e tornou os Cartórios de Protesto parceiros dos credores diligentes.
“Na medida em que só recebem o pagamento pelos serviços que prestam, se e quando o credor recuperar seu crédito, ou seja, quando o título encaminhado a Protesto for pago, cancelado ou sustado. Significa dizer que, para os títulos vencidos a menos de um ano, o protesto é gratuito para o credor”, argumenta Gaioso.
“A postergação do pagamento dos emolumentos facilita a recuperação das dívidas, pois as pessoas físicas e jurídicas podem se concentrar, num primeiro momento, no pagamento da dívida original, o que permite dividir no tempo o débito total”, acrescenta o economista da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Ulisses Ruiz de Gamboa.
Fonte: Cartórios com Você